terça-feira, 28 de maio de 2013

Um homem

Lá fora chovia. L, encostada ao vidro do café, via as pessoas correrem apressadas, com vidas cheias e assuntos pendentes. L mantinha-se ali, como se na sua vida nada estivesse por fazer, como se não houvesse ninguém à sua espera, como se não houvesse algures alguém com quem ir ter. Bebia um copo de café americano quente, era a sua tentativa de aquecer um pouco o coração. Como num passo de magia, alguém se aproxima. (...) Não foi assim que nenhum dos dois imaginou o dia do seu reencontro. Esperava-se um forte bater do coração, um friozinho na barriga, borboletas no estômago. Mas nada disso aconteceu. Foram namorados nos seus áureos tempos do secundário e havia sido a primeira grande e arrebatadora paixão das suas vidas. Acabou inesperadamente e cada um havia seguido o seu caminho, três anos depois ali estavam eles, numa mesa de um café perdido no centro da cidade onde outrora percorreram as ruas de mãos dadas e corações entrelaçados. - E as coisas contigo, está tudo bem? - Perguntava J enquanto colocava o açúcar no chá que havia pedido. - Acho que foi por isso que não deu certo. - Disse L concentrando o olhar no seu copo de café americano. - Não percebi, apenas te perguntei como estavas L... - Disse J confuso quanto à afirmação proferida por L. - Não é isso, é o chá. - Respondeu L. - O chá? - Perguntou J ainda mais confuso. - Desejei tantas vezes que fosses um homem de café e não de chá. Um homem de cerveja gelada e não de água natural. Um homem, apenas isso. Houve um constrangedor momento de silêncio e numa tentativa de fugir às cruas palavras de L, J disse: - E o que fazes tu aqui sozinha? - J evitava beber o chá que havia pedido. - Cansei-me de chorar sozinha e vim chorar para o meio da multidão. - Afirmou L com voz cansada e olhar perdido. - O que se passa L? - Perguntou J preocupado. - Uma relação falhada J. - Disse L envergonhada. - Falhada porquê? - J estava curioso quanto ao que ouvia. - Traição... - Uma lágrima escorreu do olhar de L que fixava a mesa. - Não precisas de falar, mas se quiseres desabafar não estás sozinha, eu estou aqui. - Disse J tentando aliviar um pouco a dor que sabia que L estava a sentir. - Obrigada...- Disse L não conseguindo deixar de se sentir completamente perdida. - Não agradeças, só acho que devias saber que é isso que acontece quando se procura muito mais café e muito menos chá. L olhou novamente pelo vidro molhado que a separava da multidão que corria apressada por entre as gotas de chuva. E pensou no quanto gostava de se ter apaixonado pelo jeito de chás de um senhor como J e não por um homem de cervejas geladas como R. Mas a verdade é só uma, não era de um senhor que L precisava, mas sim de um homem.