Este é um blog de sonhos. Os textos aqui publicados fazem parte do universo imaginário de LL. No entanto, apesar de serem criados no imaginário, quantos deles não nascem na realidade? *
segunda-feira, 24 de novembro de 2014
Prometo amar-te
Lembro-me bem do dia em que te conheci. Estava atrasada, estacionei o carro apressadamente e tentava acelerar os passos. Mais uma vez em contra relógio. Lembro-me que alcancei o piso das chegadas e respirei fundo. Tinha que aprender de uma vez por todas a controlar o tempo para não me estar sempre a descontrolar a mim, pensei. Quando os meus olhos finalmente alcançaram o grande ecrã, percebi que de nada me havia valido tanto esforço, o voo deles tinha atrasado duas horas. Decididamente eu e os horários tinhamos assuntos pendentes, não havia outra explicação. Decidi então ir tomar um café ali mesmo, não fosse o tempo jogar novamente contra mim. Sentei-me numa mesa que me permitisse ver o grande ecrã, queria ter a certeza que quando o avião deles aterrasse eu estaria mesmo em frente à porta de desembarque para lhes dar um abraço. Tomava um café curto, enquanto olhava em volta, tentando abstrair-me. Foi aí que te vi. O teu porte altivo, o teu olhar sério e a tua pele escura chamaram a minha atenção. De vez em quando perco-me a olhar para alguém enquanto lhe atribuo uma vida criada na minha imaginação. Contigo foi diferente, não te estava a tentar criar uma história, apenas tinhas chamado a minha atenção de forma indecifrável. Caí de repente na realidade e decidi ir fumar um cigarro. Enquanto fumava pensei no estranho que era aquele homem completamente desconhecido ter chamado a minha atenção, logo eu que depois de ter vivido o maior de todos os fracassos começara a viver mergulhada na minha solidão. Foi aí que tu chegaste e interrompeste os meus pensamentos. Naquele momento fiquei apreensiva, mas a conversa fluiu tão naturalmente que em pouco tempo acho que ambos nos esquecemos que nos haviamos acabado de conhecer. Lembro-me muitas vezes daquele dia, sabes? Tenho a certeza que naquele dia me pareceste muito diferente do homem que hoje tenho a meu lado. Hoje, seria incapaz de te imaginar a abordar-me num aeroporto. Logo eu que gosto de pintar o cabelo de vermelho e fumar, quer dizer, gostava. Sabes que voltei a ter os cabelos castanhos por ti, não sabes? Também deixei de fumar, nunca gostei da forma desaprovadora com que olhavas para mim quando eu acendia o cigarro. Somos tão diferentes, acho que foi essa diferença que nos uniu. Tu um homem de armas, acabado de chegar de uma missão no Afeganistão, cujo maior propósito era salvar vidas e honrar a pátria. Eu uma sonhadora, completamente distraída, sempre cheia de ideias e planos e que ainda acredita que a justiça se deve fazer sem guerras nem armas. Quando nos conhecemos eu não tinha a percepção de quem tu realmente eras. Tu és um herói. És um herói para os soldados que comandas, um herói para a tua família e um herói para mim também. Não é fácil ser a mulher que te acompanha. Para te acompanhar, sabes quantas vezes me esqueço de quem eu sou? Para ser sincera, de vez em quando apetece-me perder novamente a postura, andar em contra relógio e fumar um cigarro com uma garrafa de champanhe na mão, descalça, correndo pela areia da praia. Mas não o faço, porque no dia em que aceitei ficar contigo eu sabia que eras um herói. Não é fácil amar um herói, às vezes gostava que despisses essa farda e fosses tu. Às vezes gostava que te libertasses desse dever para com a pátria. Eu sei que não o farás, apesar disso tu sabes porque reparaste em mim naquele dia, da mesma forma que eu mais tarde percebi porque me havias chamado à atenção. Eu representei-te a liberdade, o sonho, era isso que faltava em ti. Tu representaste-me a realidade, que eu evitava em mim. No dia do nosso casamento sei que estarei a dizer sim ao facto de ter que te dividir com a pátria. Provavelmente serei uma daquelas mulheres que aguarda em casa, com o coração nas mãos, o fim de mais uma missão. Não era assim que me imaginava, uma mulher com os pés tão assentes na terra, com uma postura intocável, a dividir o seu herói com um quartel, ou melhor, toda a pátria. Mas fá-lo-ei, da mesma forma que cedi com os cabelos vermelhos, com os cigarros e com tantos sonhos. Porque ambos sabemos que um de nós tem que ceder. Tu não, porque tu és um herói. Resta-me dizer-te que prometo amar-te em cada regresso a casa. Prometo amar-te em cada ausência tua, JS. *
sábado, 15 de novembro de 2014
Finalmente, uma carta para ti.
O motivo pelo qual te escrevo hoje é também o motivo pelo qual não te escrevi durante todo este tempo. Talvez não o tivesse feito antes por não perceber o que estava a acontecer à minha volta e talvez o faça hoje porque sei que esse dia nunca vai chegar. Não tenho resposta, mas já deixei de fazer a pergunta. Hoje, nada me impede de te escrever, a ti, um desconhecido que um dia jurei conhecer tão bem. Não sei se te lembras de mim, sinceramente acho que mesmo que nalgum momento por qualquer motivo eu te invada a memória, não me recordas como eu merecia ser lembrada. É triste, mas já não me entristece mais. Não sei em que parte da minha vida se pode encaixar alguém como tu, entraste decidido a mudar tudo, acabaste por fazer apenas uma bagunça e foste embora. Eu cá fiquei, entretendo-me a tentar encontrar um equilíbrio no meio de tanta desordem. Não soube bem por onde começar e custou-me a aceitar que a vida tinha fugido do meu controlo, foi um processo lento. Mais do que isso, foi solitário. Recusei-me a precisar de alguém, o velho truque de arranjar alguém que nos preencha o tempo, alguém que nos distraia e faça abstrair da confusão que encontraremos ao chegar a casa, não iria funcionar comigo. Contigo, ou melhor, depois de ti, percebi que eu tinha que bastar. E quando eu não chegasse, tentava de novo no dia seguinte, eu sou mais persistente que a vida. Obrigada por me teres ensinado isso, de uma maneira tão pouco justa, aprendi muito contigo. E por isso mesmo é mentira se disser que te esqueci, não se esquece alguém como tu. Não tens mais lugar no meu coração, mas o meu cérebro recordar-te-á sempre, quantas vezes forem precisas, para que eu mantenha sempre em mim guardada a maior de todas as certezas: não farei nunca aos outros aquilo que me fizeste a mim. Durante muito tempo jogaste psicologicamente comigo de uma maneira que hoje não sei destinguir o que vivemos de verdade do que não passou de mais uma mentira. Sei que não tens noção do quão psicologicamente desgastante isso é, porque tu não tens noção de nada. Há quem diga que não és humano, eu simplesmente acho que tu és pouco. És um homem grande e ao mesmo tempo tão pequeno. Tentar perceber esta história é demasiado confuso, tenho que me tentar explicar melhor. Não, acho que não tenho, porque não me interessa mais a pergunta. Quanto à resposta acho que nem tu a tens. E se algum dia me cruzasse contigo numa rua qualquer desta cidade e viesses ao meu encontro com a resposta, eu corria. As tuas palavras não me haveriam de alcançar. Não porque eu algum dia achasse que iria retroceder no processo, és um processo arquivado, mas sim porque eu não tenho mais nada para perceber. Esta já não é a minha história. No outro dia vi uma fotografia minha, foste tu quem tirou, aquele tinha sido um dia especial. Naquele dia eu imaginei-me com oitenta anos a teu lado. Estava disposta a cuidar de ti uma vida toda, porque acreditei nas tuas palavras e no meu coração. Se te pudesse pedir alguma coisa, pedir-te-ia que não partilhasses os meus sonhos com mais ninguém. Eram meus, tu podes ser de quem quiseres, mas eles não. E tu já não és a minha história, os meus sonhos já não te pertencem. Não lhes faças como um dia nos fizeste a nós, cuida bem deles, guarda o seu brilho contigo. Em troca prometo guardar bem os teus segredos. Assim me despeço com a certeza que não tinha no dia em que te deixei "fui ali ser feliz e não volto".
terça-feira, 4 de novembro de 2014
Um homem pouco inteligente
Se tu fosses inteligente podia até ensinar-te qualquer coisa. A questão aqui é que pessoas assim não aprendem. Tu és uma delas. Acho que olhas para uma mulher e vês uma panela. O problema começa quando conheces alguém como eu. Um dia chegas a casa e está o jantar por fazer. Aí percebes que algo mudou. Mas tu, que de inteligente não tens nada mas até demonstras uma esperteza qualquer, obviamente que não ficas sem jantar. Começas por jantar fora, não queres que digam por aí que és um troca panelas! Até que chega o dia em que percebes que não há nada como uma comidinha caseira e depressa encomendas um novo conjunto de panelas. Saiu-te caro este último, acho que pagaste o preço do ridículo. De qualquer forma, poupas uns trocos em restaurantes. Como te estava a dizer, o dia em que chegaste a casa e não encontraste a panela no fogão chegou. Naquela altura qualquer pessoa teria percebido que alguma coisa tinha que mudar, mas tu, como pouco inteligente que sempre foste, achaste que a solução seria jantar fora. Nada que te incomode, tasqueiro que é tasqueiro vai sempre comer umas moelas mesmo que em casa tenha gourmet. Sabes, não sou como as mulheres que procuras, tão pouco como as que encontras. Preferi deixar o jantar por fazer, sem mais demoras, não tive paciência para te tentar explicar o facto de que, para pessoas como tu, a comida podia um dia ser salgada. Mas agora dizes por aí que encontraste a melhor panela, deve ser daquelas modernices que cozinha sozinha. Espero bem que sim, pelo que tenho visto só tens comido fritos. Será que isso tem alguma orrespondência directa com o facto de também o teu cérebro estar completamente frito?! Bom, não divaguemos. Ficaria feliz que tivesses encontrado a melhor panela, triste por saber que há mulheres que não se importam de ser uma. Acho que gostam, cozinham e até aquecem mais tarde se decidires chegar atrasado. São opções de vida, não quero perder muito tempo a tentar compreender isso. A questão é, julgaste mesmo que também eu seria uma panela? Gosto até de cozinhar e nem me importo muito de esperar, o problema é que não se cozinha uma boa feijoada a quem andou à tardinha a comer rissóis de atum na tasca. Já agora meu querido, nunca olhei para ti como se fosses uma coisa, talvez também porque não servias para nada... Mas como te disse, tiveste azar em me encontrar, devias saber que para mulheres como eu nunca passarás de uma toalha de mesa, podemos até achá-la um encanto, mas depois de suja ninguém a quer ver mais.
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