Ela era pintora, ele músico. Ambos amantes da arte. Em comum não tinham apenas anos de vida lado a lado, mas também sonhos e paixões.
-L, temos de falar.
L continuava concentrada no quadro que estava a pintar e nada dizia, então J insistiu:
-L, estás-me a ouvir? Temos que falar!
-Sim J, eu estou-te a ouvir, fala.
-Não estás a perceber, pára de pintar, é um assunto sério!
-Está bem J.
L levantou-se, puxou uma cadeira para junto de J e disse:
-Pronto, estou completamente atenta, até dos meus quadros já tens ciumes! - e sorriu.
-Eu não sei muito bem como te dizer isto, não há uma forma correcta de o fazer, quer dizer, pelo menos a mim nunca me ensinaram e duvido que de facto exista...- enquanto falava J mantinha os olhos fixos no chão.
-Que se passa? Porque não olhas para mim? Que conversa é essa?
-Eu quero que percebas o que te vou dizer, mas mais do que isso quero que depois do que eu te disser não me odeies.
-É claro que não te vou odiar, tu sabes que te amo.
Houve um longo momento de silêncio até que J disse:
-Eu trai-te.
L levantou-se repentinamente, atirou bruscamente com a cadeira e voltou-se de costas para J, permanecendo ali inerte, de cabeça baixa e soluçando compulsivamente. J não se mexeu, sentia-se congelado por dentro, não sabia como agir.
-Eu conheci a M no aniversário do R, não sei explicar o que aconteceu mas ela fascinou-me. Houve qualquer coisa nela que me atraiu, não sei explicar porque o fiz, nem porque o continuei a fazer mas...
-Poupa-me os pormenores! Há quanto tempo?- perguntou L enquanto tentava abafar o seu choro.
-Desde a tua viagem a Madrid.
-Gostas dela?- L continuava de costas voltadas, evitando encarar J.
-Sim, desculpa.
L voltou-se para J e deu-lhe um enorme estalo, gritando:
-Sabes o que é sentires-te humilhada? Sabes?!
-L, por favor, só te peço que tenhas calma. Não se escolhe de quem se gosta...
-Claro que não se escolhe de quem se gosta, porque se me dessem essa oportunidade eu não gostaria de um palerma como tu!
-Acalma-te por favor! Eu nunca quis ter-te faltado ao respeito, eu não consigo controlar tudo o que acontece comigo, eu sei que não merecias, eu sei, mas o que querias afinal? Que continuasse a enganar-te por ter pena ou medo de te deixar?
-Que fosses um homem, porque eu sempre fui uma mulher a teu lado.
-Eu sei, por isso mesmo estou a ter esta conversa contigo.
-Não, tu estás a ter esta conversa comigo porque queres que te deixe ser feliz com essa mulher qualquer que dizes amar. Faz o que quiseres, mas por favor, desaparece da minha frente que eu não consigo olhar para ti.
J levantou-se e dirigiu-se lentamente para a porta, antes de fechar a porta disse:
-Espero que um dia me consigas perdoar.
-E eu espero que um dia te façam tão infeliz como me estás a fazer a mim neste momento, e de preferência essa mulher que dizes amar.
J saiu, mal fechou a porta as lágrimas que contivera durante a conversa sairam disparadas, começou a vaguear pelas ruas desertas da cidade e ao longe ouviu alguém gritar:
-J! J!
Era P, o seu melhor amigo.
-Que se passa J? Eii, porque estás a chorar?
-Acabou tudo, disse à L que a trai, ela não vai mais conseguir olhar para mim.
-Não estou a entender! Traiste a L? Não acredito nisso!
-Não, não trai a L, sabes bem o quanto amo aquela mulher.
-Estás doido J? Então porque lhe foste dizer isso?
-Eu vou morrer a qualquer momento.
-O quê??
-Eu tenho um aneurisma, uma bomba relógio que pode explodir a qualquer momento, quando esse dia chegar não quero que a L esteja presa a mim. Não quero que ela não seja capaz de refazer a sua vida porque me perdeu inesperadamente. Quero que ela seja feliz, que encontre alguém que a faça feliz sem ter medo de no dia seguinte já não estar cá para ela.
-Meu Deus, não pode ser verdade.
-Mas é amigo, mas é. E a única coisa que te peço é que a L nunca saiba de nada disto. Nunca.
-Não podes fazer isso, é uma escolha que tem que ser ela a fazer, J não podes fazer isto!
-Já fiz, quero que ela seja feliz P, só isso. Não quero que ela viva como eu, não quero que ela tenha medo a cada hora que passa, ela não merece viver assim. Mais do que isso, ela não merece vir um dia a viver agarrada a recordações...
(...)
Por vezes atrás de uma dolorosa mentira, esconde-se uma cruel verdade.
Este é um blog de sonhos. Os textos aqui publicados fazem parte do universo imaginário de LL. No entanto, apesar de serem criados no imaginário, quantos deles não nascem na realidade? *
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
terça-feira, 20 de novembro de 2012
New York, New York.
Ela estava sentada ao balcão de um bar perdido em New York, numa mão segurava o cigarro e na outra segurava o copo. Era uma mulher bonita, realmente muito bonita, devia estar na casa dos trinta anos e já a tinha visto por lá várias noites, sempre sozinha. Aproximou-se um pouco reticente e disse:
-Boa noite, posso oferecer-lhe uma bebida?
-Boa noite, aceito sim, obrigada.
-Acompanha-me até uma mesa?- perguntou ele.
Ela também já tinha reparado nele. Tinha-o visto várias vezes naquele bar, sempre acompanhado por amigos, às vezes até na companhia de casais, o que a deixava intrigada ao ver um homem que devia ter perto de cinquenta anos sem nunca ter apresentado por lá qualquer companhia feminina. E a verdade era só uma, apesar da sua idade era um homem extremamente charmoso.
-Posso perguntar-lhe como se chama?
-Maria.
-Maria? A Maria não é americana pois não?
-Porque pergunta?
-Tem um sotaque que não consigo assemelhar ao sotaque de nenhum dos nossos estados e o seu nome também não é americano.
-Sou portuguesa.
-E o que faz uma bonita portuguesa sozinha num bar de New York?
-Vivo em New York.
-Ah, é emigrante. Deixe-me adivinhar, veio atrás do «sonho americano»?
-Não sou uma mulher sonhadora, vim atrás de um emprego, vim atrás de estabilidade.
-E encontrou-a?
-A estabilidade que eu procuro não é fácil de encontrar.
-Posso então perguntar-lhe o que faz?
-Trabalho num antiquário, ou seja, vendo o que já ninguém quer comprar. A vantagem é que não tenho um emprego cansativo, e o pó fica sempre bem na montra de exposição.
-Já vi que tem um humor fantástico Maria. Mas conte-me, porquê New York?
-Faço parte de uma geração que em Portugal apelidamos de «geração à rasca», quando saí da universidade em menos de um ano já tinha feito a mala e decidido ir embora do meu país.
-Posso perguntar-lhe o que estudou na universidade?
-Direito.
-Então é uma advogada que trabalha num antiquário de New York... Acho que já percebi, a estabilidade que procura é poder vir a exercer algo relacionado com a sua profissão.
-Não, eu diria que sou uma advogada que trabalha num antiquário de New York e que sonha viver da escrita.
-Não veio atrás do american dream, a Maria veio atrás de um sonho seu. Admiro isso numa mulher jovem, veio sozinha?
-Sim.
-A sua família devia ser uma família de poucas posses, veio atrás de um sonho e ao mesmo tempo quer poder ajudá-los, acertei?
-Não propriamente, eu diria que a minha família vive bem melhor que eu. Os meus pais fazem parte de uma classe média alta e não tenho irmãos.
-Assim torna-se um pouco difícil perceber o motivo que a fez vir, compreendo a situação do seu país, mas pelos vistos não era a mesma situação da sua família.
-Vim em busca de liberdade e deparei-me com a solidão, acho que foi isso que aconteceu.
-Porque não volta?
-Se ter dinheiro implica voltar para casa dos meus pais, não obrigada.
Ele olhou para Maria e viu uma mulher completamente indecifrável à sua frente. Era sem dúvida uma mulher culta, estudada, uma mulher vivida que passava horas a fio durante a noite a escrever e escrever e escrever. Mesmo sabendo que o mais certo seria nunca ninguém chegar a ler o que tanto quis fazer chegar a um grande público de leitores. Decidiu então continuar, estava encantado com a mulher que tinha à sua frente.
-A Maria é casada ou algo do género?
-Não, nunca casei, não tenho filhos e já lhe disse que não tenho irmãos?
O àlcool começava agora a manifestar sinais exteriores em Maria.
-Sim, já. Deve ter sido muito mimada.
-Eu diria mais, devo ter sido muito pressionada! Pressionada a ser tudo aquilo que os meus pais desejavam num filho. Tive que ser bem comportada, tirar boas notas, ir para a universidade, não sair muito para não andar com más companhias...
-Já percebi o porquê de ter saído de casa dos seus pais.
-Não, não percebeu. Eu não saí só de casa dos meus pais, afastei-me da minha família, dos meus amigos e até de um antigo amor.
-Deixou um amor para trás?
-Era fraco de mais para me acompanhar. Disse que eu era uma louca e que mais tarde ou mais cedo voltaria para Portugal arrependida de algum dia ter ido embora. A verdade é que não voltei, embora não tenha feito nada pela minha vida, voltar também não faz parte das minhas opções.
-E o seu amor? Que é feito dele?
-Casou, tem filhos e todas essas coisas bonitas.
-Ainda fala nele, não o esqueceu.
-Acho que o problema é nunca ter vivido nada semelhante ao que vivi com ele. E a mágoa, a mágoa de termos feito planos durante anos. Planeávamos acabar a universidade e sair da nossa cidade, chegamos mesmo a falar em New York e de facto aqui estou eu, mas sozinha. Eu não desisto dos meus sonhos, se nunca os chegar a realizar ninguém poderá dizer que não tentei. E aquele otário ficou na santa terrinha e ainda conseguiu casar com uma antiga amiga minha. Merecem-se, são os dois uns palermas.
-Há quanto tempo não vai a Portugal?
-À tempo suficiente para os meus pais dizerem que eu sou a maior desilusão que podiam ter tido. Acho que eles pensam que tenha uma vida pouco decente por aqui. Até compreendo que tendo criado uma pessoa como eu seja difícil acreditar que estou em New York a trabalhar num antiquário e que só não vivo na companhia de um gato porque faço alergia ao seu pêlo...
A conversa prolongou-se entre drinks e cigarros. Ele tinha-a achado uma mulher encantadora, apesar de ter percebido desde a primeira conversa que mantiveram naquele bar de New York, que Maria vivia à beira de um abismo. Sairam aquela e várias noites. E querem saber o que aconteceu? Apaixonaram-se. A bonita portuguesa de trinta anos apaixonou-se pelo charmoso americano de quase cinquenta. Talvez ela tenha visto nele uma protecção e ele tenha visto nela a companhia que tanto precisava. No ano a seguir casaram, em New York. Um ano após o casamento visitaram Portugal, a família, os poucos amigos que ela mantivera. Todos ficaram admirados com o casamento de Maria, não era um casamento qualquer, era aquilo que só mais tarde ela percebera, o casamento com um dos homens mais importantes de New York. Maria deixou o antiquário e com a ajuda do marido lançou o seu primeiro livro, entitulado That's not an american dream, that's my dream.
Foi um sucesso e o seu antigo amor chegou a ler a tradução do livro em português, comprado a muito custo com o seu dinheiro contado para as despesas da casa, dos filhos e da mulher.
-Boa noite, posso oferecer-lhe uma bebida?
-Boa noite, aceito sim, obrigada.
-Acompanha-me até uma mesa?- perguntou ele.
Ela também já tinha reparado nele. Tinha-o visto várias vezes naquele bar, sempre acompanhado por amigos, às vezes até na companhia de casais, o que a deixava intrigada ao ver um homem que devia ter perto de cinquenta anos sem nunca ter apresentado por lá qualquer companhia feminina. E a verdade era só uma, apesar da sua idade era um homem extremamente charmoso.
-Posso perguntar-lhe como se chama?
-Maria.
-Maria? A Maria não é americana pois não?
-Porque pergunta?
-Tem um sotaque que não consigo assemelhar ao sotaque de nenhum dos nossos estados e o seu nome também não é americano.
-Sou portuguesa.
-E o que faz uma bonita portuguesa sozinha num bar de New York?
-Vivo em New York.
-Ah, é emigrante. Deixe-me adivinhar, veio atrás do «sonho americano»?
-Não sou uma mulher sonhadora, vim atrás de um emprego, vim atrás de estabilidade.
-E encontrou-a?
-A estabilidade que eu procuro não é fácil de encontrar.
-Posso então perguntar-lhe o que faz?
-Trabalho num antiquário, ou seja, vendo o que já ninguém quer comprar. A vantagem é que não tenho um emprego cansativo, e o pó fica sempre bem na montra de exposição.
-Já vi que tem um humor fantástico Maria. Mas conte-me, porquê New York?
-Faço parte de uma geração que em Portugal apelidamos de «geração à rasca», quando saí da universidade em menos de um ano já tinha feito a mala e decidido ir embora do meu país.
-Posso perguntar-lhe o que estudou na universidade?
-Direito.
-Então é uma advogada que trabalha num antiquário de New York... Acho que já percebi, a estabilidade que procura é poder vir a exercer algo relacionado com a sua profissão.
-Não, eu diria que sou uma advogada que trabalha num antiquário de New York e que sonha viver da escrita.
-Não veio atrás do american dream, a Maria veio atrás de um sonho seu. Admiro isso numa mulher jovem, veio sozinha?
-Sim.
-A sua família devia ser uma família de poucas posses, veio atrás de um sonho e ao mesmo tempo quer poder ajudá-los, acertei?
-Não propriamente, eu diria que a minha família vive bem melhor que eu. Os meus pais fazem parte de uma classe média alta e não tenho irmãos.
-Assim torna-se um pouco difícil perceber o motivo que a fez vir, compreendo a situação do seu país, mas pelos vistos não era a mesma situação da sua família.
-Vim em busca de liberdade e deparei-me com a solidão, acho que foi isso que aconteceu.
-Porque não volta?
-Se ter dinheiro implica voltar para casa dos meus pais, não obrigada.
Ele olhou para Maria e viu uma mulher completamente indecifrável à sua frente. Era sem dúvida uma mulher culta, estudada, uma mulher vivida que passava horas a fio durante a noite a escrever e escrever e escrever. Mesmo sabendo que o mais certo seria nunca ninguém chegar a ler o que tanto quis fazer chegar a um grande público de leitores. Decidiu então continuar, estava encantado com a mulher que tinha à sua frente.
-A Maria é casada ou algo do género?
-Não, nunca casei, não tenho filhos e já lhe disse que não tenho irmãos?
O àlcool começava agora a manifestar sinais exteriores em Maria.
-Sim, já. Deve ter sido muito mimada.
-Eu diria mais, devo ter sido muito pressionada! Pressionada a ser tudo aquilo que os meus pais desejavam num filho. Tive que ser bem comportada, tirar boas notas, ir para a universidade, não sair muito para não andar com más companhias...
-Já percebi o porquê de ter saído de casa dos seus pais.
-Não, não percebeu. Eu não saí só de casa dos meus pais, afastei-me da minha família, dos meus amigos e até de um antigo amor.
-Deixou um amor para trás?
-Era fraco de mais para me acompanhar. Disse que eu era uma louca e que mais tarde ou mais cedo voltaria para Portugal arrependida de algum dia ter ido embora. A verdade é que não voltei, embora não tenha feito nada pela minha vida, voltar também não faz parte das minhas opções.
-E o seu amor? Que é feito dele?
-Casou, tem filhos e todas essas coisas bonitas.
-Ainda fala nele, não o esqueceu.
-Acho que o problema é nunca ter vivido nada semelhante ao que vivi com ele. E a mágoa, a mágoa de termos feito planos durante anos. Planeávamos acabar a universidade e sair da nossa cidade, chegamos mesmo a falar em New York e de facto aqui estou eu, mas sozinha. Eu não desisto dos meus sonhos, se nunca os chegar a realizar ninguém poderá dizer que não tentei. E aquele otário ficou na santa terrinha e ainda conseguiu casar com uma antiga amiga minha. Merecem-se, são os dois uns palermas.
-Há quanto tempo não vai a Portugal?
-À tempo suficiente para os meus pais dizerem que eu sou a maior desilusão que podiam ter tido. Acho que eles pensam que tenha uma vida pouco decente por aqui. Até compreendo que tendo criado uma pessoa como eu seja difícil acreditar que estou em New York a trabalhar num antiquário e que só não vivo na companhia de um gato porque faço alergia ao seu pêlo...
A conversa prolongou-se entre drinks e cigarros. Ele tinha-a achado uma mulher encantadora, apesar de ter percebido desde a primeira conversa que mantiveram naquele bar de New York, que Maria vivia à beira de um abismo. Sairam aquela e várias noites. E querem saber o que aconteceu? Apaixonaram-se. A bonita portuguesa de trinta anos apaixonou-se pelo charmoso americano de quase cinquenta. Talvez ela tenha visto nele uma protecção e ele tenha visto nela a companhia que tanto precisava. No ano a seguir casaram, em New York. Um ano após o casamento visitaram Portugal, a família, os poucos amigos que ela mantivera. Todos ficaram admirados com o casamento de Maria, não era um casamento qualquer, era aquilo que só mais tarde ela percebera, o casamento com um dos homens mais importantes de New York. Maria deixou o antiquário e com a ajuda do marido lançou o seu primeiro livro, entitulado That's not an american dream, that's my dream.
Foi um sucesso e o seu antigo amor chegou a ler a tradução do livro em português, comprado a muito custo com o seu dinheiro contado para as despesas da casa, dos filhos e da mulher.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
Um final quase perfeito.
Chegou exactamente à hora combinada, eram oito horas da noite e a campainha tocou. Sabia que era ele, abriu a porta e pediu-lhe que entrasse. Como sempre ele estava bem-disposto, cumprimentou-a e sorriu. Quando se dirigiam para o quarto ela mantinha-se em silêncio enquanto ele ia dizendo que ela era linda vestindo qualquer coisa e que mesmo assim perdia tanto tempo a arranjar-se que acabava sempre por nunca estar pronta à hora marcada. Sentou-se na cama dela, achou estranho esta não estar repleta de roupas como habitualmente, sabia bem o quão desarrumada a sua namorada era, conseguindo transportar tudo o que tinha dentro do armário para cima da cama até conseguir escolher a roupa adequada para a ocasião. Mas, estava tão entusiasmado, que naquele momento aquilo pareceu-lhe um mero pormenor sem importância. Olhou carinhosamente para ela, com um olhar de namorado orgulhoso por tê-la a seu lado e disse:
-L, de pijama ainda? Anda lá amor, despacha-te.
-É que...
-Não, espera! Eu só te ia contar ao jantar mas não aguento mais esperar e por este andar chegamos à meia noite ao restaurante e eu tenho que...
-Que foi M? Aconteceu alguma coisa? - interrompeu L.
-Aconteceu!
-É grave? A tua mãe não está melhor? Eu posso...
-Não, não tem nada a ver com isso! A minha mãe está melhor e regressou hoje ao trabalho, conheces aquela mulher, não é uma pneumonia que a derrota!
-Que bom, fico contente, mas então o que se passa?
-Comprei duas passagens de avião.
-Duas passagens de avião? Como assim?
-Vamos a Paris meu amor! Vou-te levar a Paris! Eu sei que querias ir e já reservei o hotel, com vista para a Torre Eiffel claro e não te preocupes com nada, só precisas de fazer a mala e...
-M, eu não estou a entender... Não me falaste em Paris...
-Claro que não te falei em Paris, era surpresa meu amor. Queria ter-te contado só ao jantar, porque hoje vou levar-te ao melhor restaurante desta cidade! Mas não aguentei esperar mais para te dizer. Eu sei o quanto gostavas de conhecer Paris e por isso vamos a Paris. Quero que percebas que eu vou realizar todos os sonhos da mulher da minha vida.
-Não posso acreditar!
-Podes sim, vais finalmente conhecer la cité de l'amour!
-Não!
L deu um grito, como se estivesse assustada, como se estivesse com medo. M não conseguia compreender o que se estava a passar. Conhecera L à um ano atrás e era apaixonado por ela como poucas pessoas já se apaixonaram na vida. Comprara as passagens de avião porque sabia que L sonhava com o dia em que visitasse Paris, em que subisse à Torre Eiffel, em que conhecesse o mundo da Disney que povou a sua infância, em que passeasse pelos Campos Elísios como vira em filmes durante anos. No entanto, após ter dado a novidade, ao em vés de receber um grande abraço, de ouvir gritos de esterismo, de felicidade da sua namorada, não, viu tristeza no seu olhar, viu medo, viu culpa.
-O que se passa L?
-Nós não vamos a Paris.
-Porque estás a chorar? Porque me dizes que não vamos a Paris? O que se passa? Diz de uma vez!
-Olha para mim M, estou de pijama.
-Sim eu consigo perceber isso, só não consigo perceber é o que se passa!
-Eu estava à espera que chegasses para ter uma conversa contigo, eu nunca pretendi ir jantar fora.
-Explica-te L!
-Eu estava à espera que chegasses para termos uma conversa e não para irmos jantar fora. Acabou M, era isto que te queria dizer... (houve um enorme silêncio e M nada disse, então L continuou)
E depois tu chegaste a dizer que compraste passagens de avião e que querias realizar todos os meus sonhos, pode não ser o momento, mas quanto mais tarde pior e...
-Acabou? Como assim acabou? Porquê L?
-Porque eu não suporto mais viver a relação perfeita, eu preciso de correr riscos, preciso de ter uma vida que não vá de encontro à perfeição de relacionameno em que mergulhamos.
-Não entendo, o que querias afinal? Que te fizesse infeliz?
-Não, tu és uma pessoa incrível, mas eu não sou mulher para entrar no teu mundo de perfeição. Eu não sou a mulher a quem devas realizar todos os sonhos. Eu não suporto mais viver dentro dos limites de um namoro que pode ser invejado por todas as mulheres deste mundo mas que não é o que eu quero para mim. E os meus sonhos, deixa-me ser eu a realizá-los. Eu quero viver a minha vida fora dos dias monótonos da nossa relação, não suporto viver mais no mundo encantado que construimos.
-Eu não acredito no que acabei de ouvir. Estas a dizer que te cansaste de mim porque eu fazia tudo bem?
-Sim.
-Mas o que é que tu queres L? Que te faça infeliz? Que me esqueça de ti enquanto ando de bebedeira em bebedeira? Que te dê todo o espaço do mundo? Que te trate mal?
L olhou para M com ar de quem lamentava o que estava a acontecer e disse:
-Quero viver a minha vida longe desta história de amor com desfecho tão previsível de final feliz, é isso que eu quero, saber o que é a vida longe deste mundo encantado.
Soubesse ela o quão bom teria sido viver o final perfeito.
-L, de pijama ainda? Anda lá amor, despacha-te.
-É que...
-Não, espera! Eu só te ia contar ao jantar mas não aguento mais esperar e por este andar chegamos à meia noite ao restaurante e eu tenho que...
-Que foi M? Aconteceu alguma coisa? - interrompeu L.
-Aconteceu!
-É grave? A tua mãe não está melhor? Eu posso...
-Não, não tem nada a ver com isso! A minha mãe está melhor e regressou hoje ao trabalho, conheces aquela mulher, não é uma pneumonia que a derrota!
-Que bom, fico contente, mas então o que se passa?
-Comprei duas passagens de avião.
-Duas passagens de avião? Como assim?
-Vamos a Paris meu amor! Vou-te levar a Paris! Eu sei que querias ir e já reservei o hotel, com vista para a Torre Eiffel claro e não te preocupes com nada, só precisas de fazer a mala e...
-M, eu não estou a entender... Não me falaste em Paris...
-Claro que não te falei em Paris, era surpresa meu amor. Queria ter-te contado só ao jantar, porque hoje vou levar-te ao melhor restaurante desta cidade! Mas não aguentei esperar mais para te dizer. Eu sei o quanto gostavas de conhecer Paris e por isso vamos a Paris. Quero que percebas que eu vou realizar todos os sonhos da mulher da minha vida.
-Não posso acreditar!
-Podes sim, vais finalmente conhecer la cité de l'amour!
-Não!
L deu um grito, como se estivesse assustada, como se estivesse com medo. M não conseguia compreender o que se estava a passar. Conhecera L à um ano atrás e era apaixonado por ela como poucas pessoas já se apaixonaram na vida. Comprara as passagens de avião porque sabia que L sonhava com o dia em que visitasse Paris, em que subisse à Torre Eiffel, em que conhecesse o mundo da Disney que povou a sua infância, em que passeasse pelos Campos Elísios como vira em filmes durante anos. No entanto, após ter dado a novidade, ao em vés de receber um grande abraço, de ouvir gritos de esterismo, de felicidade da sua namorada, não, viu tristeza no seu olhar, viu medo, viu culpa.
-O que se passa L?
-Nós não vamos a Paris.
-Porque estás a chorar? Porque me dizes que não vamos a Paris? O que se passa? Diz de uma vez!
-Olha para mim M, estou de pijama.
-Sim eu consigo perceber isso, só não consigo perceber é o que se passa!
-Eu estava à espera que chegasses para ter uma conversa contigo, eu nunca pretendi ir jantar fora.
-Explica-te L!
-Eu estava à espera que chegasses para termos uma conversa e não para irmos jantar fora. Acabou M, era isto que te queria dizer... (houve um enorme silêncio e M nada disse, então L continuou)
E depois tu chegaste a dizer que compraste passagens de avião e que querias realizar todos os meus sonhos, pode não ser o momento, mas quanto mais tarde pior e...
-Acabou? Como assim acabou? Porquê L?
-Porque eu não suporto mais viver a relação perfeita, eu preciso de correr riscos, preciso de ter uma vida que não vá de encontro à perfeição de relacionameno em que mergulhamos.
-Não entendo, o que querias afinal? Que te fizesse infeliz?
-Não, tu és uma pessoa incrível, mas eu não sou mulher para entrar no teu mundo de perfeição. Eu não sou a mulher a quem devas realizar todos os sonhos. Eu não suporto mais viver dentro dos limites de um namoro que pode ser invejado por todas as mulheres deste mundo mas que não é o que eu quero para mim. E os meus sonhos, deixa-me ser eu a realizá-los. Eu quero viver a minha vida fora dos dias monótonos da nossa relação, não suporto viver mais no mundo encantado que construimos.
-Eu não acredito no que acabei de ouvir. Estas a dizer que te cansaste de mim porque eu fazia tudo bem?
-Sim.
-Mas o que é que tu queres L? Que te faça infeliz? Que me esqueça de ti enquanto ando de bebedeira em bebedeira? Que te dê todo o espaço do mundo? Que te trate mal?
L olhou para M com ar de quem lamentava o que estava a acontecer e disse:
-Quero viver a minha vida longe desta história de amor com desfecho tão previsível de final feliz, é isso que eu quero, saber o que é a vida longe deste mundo encantado.
Soubesse ela o quão bom teria sido viver o final perfeito.
sábado, 10 de novembro de 2012
Primeiro ela e depois eu.
Pensei em fazer uma dieta, mas comer uma folha de alface por dia nunca foi alimento para uma mulher como eu. No outro dia até dei por mim a pensar que se vestisse as roupas que se usavam no tempo da minha avó talvez apreciasses mais o meu estilo, mas não faço ideia do sítio onde ela as vai desencantar e achei que pedir emprestado seria desagradável, afinal de contas, ela já te tinha emprestado a ti e eu nunca gostei de abusar da boa vontade das pessoas. Bem, na verdade ela não te emprestou de boa vontade, se calhar fui mal educada, não devia ter-te levado sem pedir mas nunca pensei que ela fosse assim tão egoista. Um Sábado destes dei por mim no ginásio, ouvi dizer que ela era muito adepta de desporto e pensei que talvez assim deixasse de ser a tua segunda escolha, mas depois das primeiras dores musculares do dia seguinte a minha preguiça obrigou-me a desistir da ideia de querer ser tão atlética quanto ela. Quando a encontrei no café reparei que ela estava a beber uma àgua mas quando dei por mim já tinha pedido um chocolate quente e tentei desculpar-me a mim mesma com a ideia de que nem bebendo seis litros de àgua por dia e comendo só uma alface por semana ficaria tão elegante quanto ela. Não que eu seja invejosa, mas de facto ela é tão elegante que pode andar com o cabelo sempre bem esticado, de certo que passa pelas gotas de chuva sem se molhar. Por falar em cabelos, nunca preferiste as loiras pois não? Não deves ter queda para mulheres burras, mas eu não sabia. Porque eu e o meu cabelo loiro tivemos queda para ti, mesmo sabendo que pertencias a uma morena qualquer que se passeia por esta cidade com o nariz tão levantado que eu dou por mim a pensar se será apenas porque é uma pessoa tão segura de si mesma ou está é constantemente a imaginar desenhos com as formas das nuvens. Quero acreditar na segunda hipótese, pelo menos assim posso-lhe atribuir criatividade. De qualquer forma não pretendo pintar o meu cabelo, acho que ser loira adequa-se mais ao meu perfil, afinal de contas não fui muito inteligente. Se fosse inteligente já não estaria aqui à espera do dia em que o primeiro lugar fosse meu e pela primeira vez na tua vida eu deixasse de ser a outra. Não é que eu seja egoísta como ela, mas preferia que fosse ela a preencher as minhas ausências em vez de ser eu a estar à espera das tuas horas vagas. Já pensei várias vezes em tudo o que a distingue de mim, mas por mais que tente, não me consigo assemelhar a ela.
Um dia vou perceber que mesmo que ela engorde, pinte o cabelo de loiro e deixe de ser atlética vai ser sempre a tua escolha. Dizem que se chama amor, eu sei o que isso é, porque mesmo que um dia engordes, confundas roupa com trapos e continues ao lado dela, continuas a ser a minha primeira escolha. Vou perceber também que mesmo que um dia fique tão elegante como um palito, tenha o cabelo escuro e vá todos os dias ao ginásio, serei sempre a tua segunda opção. Dizem que se chama atracção, e ouvi dizer que essas coisas morrem, mais dia menos dia. Já me disseram que ela é o grande amor da tua vida e que por mais caminhos que percorras o teu destino final passará sempre por ela mas deixem-me ao menos sonhar, sonhar com as horas que passo a teu lado, aquelas em que me fazes promessas que ambos sabemos que nunca irás cumprir. De qualquer forma, serás sempre a minha primeira, última e única escolha, mesmo quando as minhas amigas me tentam fazer perceber que não me posso contentar em ser a outra de alguém. Ah, e desculpa, mas quando disse que não era invejosa menti. Eu invejo-a, invejo-a por ter a certeza que todos os dias lhe dizes que ela é a mulher da tua vida.
Um dia vou perceber que mesmo que ela engorde, pinte o cabelo de loiro e deixe de ser atlética vai ser sempre a tua escolha. Dizem que se chama amor, eu sei o que isso é, porque mesmo que um dia engordes, confundas roupa com trapos e continues ao lado dela, continuas a ser a minha primeira escolha. Vou perceber também que mesmo que um dia fique tão elegante como um palito, tenha o cabelo escuro e vá todos os dias ao ginásio, serei sempre a tua segunda opção. Dizem que se chama atracção, e ouvi dizer que essas coisas morrem, mais dia menos dia. Já me disseram que ela é o grande amor da tua vida e que por mais caminhos que percorras o teu destino final passará sempre por ela mas deixem-me ao menos sonhar, sonhar com as horas que passo a teu lado, aquelas em que me fazes promessas que ambos sabemos que nunca irás cumprir. De qualquer forma, serás sempre a minha primeira, última e única escolha, mesmo quando as minhas amigas me tentam fazer perceber que não me posso contentar em ser a outra de alguém. Ah, e desculpa, mas quando disse que não era invejosa menti. Eu invejo-a, invejo-a por ter a certeza que todos os dias lhe dizes que ela é a mulher da tua vida.
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Eu sei o que isso é, e não é amor.
Se lhe pedissem para se descrever, ela não o saberia fazer. Não se conhecia a si mesma, tendo diversas vezes quebrado princípios que orgulhosamente apelidava como seus. Era incapaz de conhecer os seus limites e frequentemente caia em depressão. Era instável, e essa instabilidade roubara-lhe muitas vezes a felicidade. Não tinha muitos amigos, mas estava constantemente rodeada de rostos conhecidos e caras que podiam não conhecer a sua história, mas sabiam o seu nome. Entrou no café, com o olhar pensativo, expressões vagas e olhou em volta. Encontrou finalmente P, sentado numa mesa ao fundo do café e dirigiu-se a ele, cumprimentando-o e sentando-se na cadeira à sua frente.
-Boa noite P, como estas?
-Boa noite L, bem e tu?
-Também.
A voz dela era suave, como que apagada, e a delicadeza com que se dirigiu à senhora que a atendera, pedindo-lhe um café, deixou P confuso quanto à mulher que tinha à sua frente. A L que ele conhecera, a L que fora sua namorada, não era a mulher de olhar perdido e voz cansada que ele via agora e mesmo tendo passado breves minutos desde a sua entrada no café, disso ele tinha a certeza.
-Fico contente que tenhas aceite tomar um café comigo. Mas conta-me, como estão as coisas contigo?
-Relembra-me o ponto em que deixaste de fazer parte da minha vida, para ver se encontro alguma coisa que te possa interessar ouvir...
-Acho que foi na altura da tua vida em que te decidiste atirar de cabeça a novos relacionamentos, ou tentativas disso...
-Porque eram amargos e cobardes.
P olhou para L com um olhar desaprovador, como que rejeitando a mulher em que ela se transformara quando o deixou. Ele sempre soubera, mas agora não restava qualquer dúvida, que depois dele ela não fora capaz de construir mais nada. Fizera diversos projectos, mas nenhum deles passou do papel. Não fora capaz de transformar numa história de amor nenhum dos relacionamentos que tentou manter. E o que mais o confundia era porque é que ela o fizera, porquê tentar? Exitou em perguntar, mas sentia-se demasiado tentado em tentar perceber o porquê de uma mulher que por si havia sido tão amada se entregar a relações que mais não fizeram do que apagá-la.
-Porquê L? Porquê tentar?
-Por medo, medo da solidão.
-Mas olha para ti agora! Estás sozinha, não conseguiste construir nada, não tens nada! Depois de mim não foste capaz de amar alguém... não és capaz!
P calou-se repentinamente, mal viu uma lágrima escorrer dos olhos tristes e apagados de L. Nunca a vira chorar, segundo o próprio dizia, nada era capaz de derrotar uma mulher pedra como ela. Percebeu então que ela estava frágil, que a pedra que tinha no coração se havia transformado num novelo que já havia dado tantas voltas que a apagava enquanto pessoa, enquanto mulher. Não fora capaz de dizer nada, não sabia lidar com a L que estava a conhecer naquele momento. L respirou fundo, tentou limpar as lágrimas disfarçadamente, como que numa tentativa de disfarçar a vergonha que sentia por alguém a ter visto chorar, e disse:
-Estou sozinha, demasiado habituada a estar sozinha, tão habituada que mesmo tendo a certeza que por diversas vezes podia ter construído algo não fui capaz. A solidão em que mergulhei prende-me a mim mesma, e gostava muito de te dizer que estou radiante de felicidade e que isso se deve a uma qualquer pessoa maravilhosa que entrou na minha vida, mas isso não aconteceu... (fez uma breve pausa para conter as lágrimas que ameaçavam sair disparadas) Ou se calhar até entraram diversas pessoas maravilhosas na minha vida mas eu sou capaz de destruir o mais bonito dos sentimentos que alguém nutra por mim.
-Não te destruas a ti mesma L, não depois de teres sido a mulher que já foste.
-Pára de falar de mim, não vim aqui para ser julgada. Porque me convidaste para este café? Para te sentires o herói da história da minha vida? Isso não vai acontecer, eu não preciso de ti nem dos teus conselhos. Vivi este tempo todo sem ti, se nalgum momento precisei de ti esse momento não é agora.
-Sabes porque te convidei para este café L, sabes? Porque ao longo deste tempo todo vi a mulher que amo a destruir-se, sem poder fazer nada... Posso ao menos dizer-te o quanto ainda te amo mesmo não te conhecendo mais? Estou aqui porque eu sei e tu também sabes que juntos conseguiriamos construir ainda mais do que aquilo que já fomos capazes.
-Não, estás aqui porque vês em mim aquilo que tanto temes, a solidão. Estás aqui porque estás com medo de acabar sozinho, como estás agora. Estás aqui porque pensas que me amas mas eu sei bem o que isso é, e não é amor... é medo. Mas não temas, aprendes a dar valor a muitas outras coisas, quando deixas de ter alguém que te dê valor a ti. Sabes, estás aqui porque no fundo somos iguais. Mas se calhar essa é a razão porque te amei a ti, e só a ti. E agora vou embora...
-L! Espera! Se achas que sou como tu, queres ver-me a afundar em relacionamentos fracassados, amargos, cobardes?!
Não houve resposta, apenas um virar de costas de L e um silêncio profundo, esse sim, amargo e cobarde.
-Boa noite P, como estas?
-Boa noite L, bem e tu?
-Também.
A voz dela era suave, como que apagada, e a delicadeza com que se dirigiu à senhora que a atendera, pedindo-lhe um café, deixou P confuso quanto à mulher que tinha à sua frente. A L que ele conhecera, a L que fora sua namorada, não era a mulher de olhar perdido e voz cansada que ele via agora e mesmo tendo passado breves minutos desde a sua entrada no café, disso ele tinha a certeza.
-Fico contente que tenhas aceite tomar um café comigo. Mas conta-me, como estão as coisas contigo?
-Relembra-me o ponto em que deixaste de fazer parte da minha vida, para ver se encontro alguma coisa que te possa interessar ouvir...
-Acho que foi na altura da tua vida em que te decidiste atirar de cabeça a novos relacionamentos, ou tentativas disso...
-Porque eram amargos e cobardes.
P olhou para L com um olhar desaprovador, como que rejeitando a mulher em que ela se transformara quando o deixou. Ele sempre soubera, mas agora não restava qualquer dúvida, que depois dele ela não fora capaz de construir mais nada. Fizera diversos projectos, mas nenhum deles passou do papel. Não fora capaz de transformar numa história de amor nenhum dos relacionamentos que tentou manter. E o que mais o confundia era porque é que ela o fizera, porquê tentar? Exitou em perguntar, mas sentia-se demasiado tentado em tentar perceber o porquê de uma mulher que por si havia sido tão amada se entregar a relações que mais não fizeram do que apagá-la.
-Porquê L? Porquê tentar?
-Por medo, medo da solidão.
-Mas olha para ti agora! Estás sozinha, não conseguiste construir nada, não tens nada! Depois de mim não foste capaz de amar alguém... não és capaz!
P calou-se repentinamente, mal viu uma lágrima escorrer dos olhos tristes e apagados de L. Nunca a vira chorar, segundo o próprio dizia, nada era capaz de derrotar uma mulher pedra como ela. Percebeu então que ela estava frágil, que a pedra que tinha no coração se havia transformado num novelo que já havia dado tantas voltas que a apagava enquanto pessoa, enquanto mulher. Não fora capaz de dizer nada, não sabia lidar com a L que estava a conhecer naquele momento. L respirou fundo, tentou limpar as lágrimas disfarçadamente, como que numa tentativa de disfarçar a vergonha que sentia por alguém a ter visto chorar, e disse:
-Estou sozinha, demasiado habituada a estar sozinha, tão habituada que mesmo tendo a certeza que por diversas vezes podia ter construído algo não fui capaz. A solidão em que mergulhei prende-me a mim mesma, e gostava muito de te dizer que estou radiante de felicidade e que isso se deve a uma qualquer pessoa maravilhosa que entrou na minha vida, mas isso não aconteceu... (fez uma breve pausa para conter as lágrimas que ameaçavam sair disparadas) Ou se calhar até entraram diversas pessoas maravilhosas na minha vida mas eu sou capaz de destruir o mais bonito dos sentimentos que alguém nutra por mim.
-Não te destruas a ti mesma L, não depois de teres sido a mulher que já foste.
-Pára de falar de mim, não vim aqui para ser julgada. Porque me convidaste para este café? Para te sentires o herói da história da minha vida? Isso não vai acontecer, eu não preciso de ti nem dos teus conselhos. Vivi este tempo todo sem ti, se nalgum momento precisei de ti esse momento não é agora.
-Sabes porque te convidei para este café L, sabes? Porque ao longo deste tempo todo vi a mulher que amo a destruir-se, sem poder fazer nada... Posso ao menos dizer-te o quanto ainda te amo mesmo não te conhecendo mais? Estou aqui porque eu sei e tu também sabes que juntos conseguiriamos construir ainda mais do que aquilo que já fomos capazes.
-Não, estás aqui porque vês em mim aquilo que tanto temes, a solidão. Estás aqui porque estás com medo de acabar sozinho, como estás agora. Estás aqui porque pensas que me amas mas eu sei bem o que isso é, e não é amor... é medo. Mas não temas, aprendes a dar valor a muitas outras coisas, quando deixas de ter alguém que te dê valor a ti. Sabes, estás aqui porque no fundo somos iguais. Mas se calhar essa é a razão porque te amei a ti, e só a ti. E agora vou embora...
-L! Espera! Se achas que sou como tu, queres ver-me a afundar em relacionamentos fracassados, amargos, cobardes?!
Não houve resposta, apenas um virar de costas de L e um silêncio profundo, esse sim, amargo e cobarde.
terça-feira, 18 de setembro de 2012
O jogo
Já passava das nove horas da noite quando nos sentamos à mesa para jantar. Era mais um jantar de amigos, mas não de dois amigos quaisquer. Entre nós existia bem mais que uma amizade, mas mesmo assim insistiamos em manter essa fachada e dizer constantemente ''o meu amigo P...'' em alto e bom som para que quem nos rodeasse não ousasse confundir as coisas. Olhei para ti, enquanto servias o vinho branco que tanto apreciamos e o meu pensamento recuou seis meses atrás. Recuou até à noite em que tudo começou, tinhamos bebido demasiado na festa de aniversário do M, dizem que me foste levar a casa, não me recordo. Mas lembro-me perfeitamente (ou não fosse o àlcool ter perdido o seu efeito em mim) do momento em que acordei e te vi deitado a meu lado. Não foi como nos filmes, não houve nenhum berro estridente nem nenhuma cara assustada pedindo-te que fosses embora. Não. Toquei-te suavamente, não querendo ter nenhum contacto demasiado intimo contigo, e quando abris-te os olhos desejei-te calmamente um bom dia e perguntei-te o que fazias ali. Foi a partir desse dia que a nossa história começou. Bebiamos uns copos a mais e sabiamos que no outro dia acordariamos juntos, vezes e vezes sem conta. Com o tempo criamos uma relação que nenhum de nós saberia explicar ao certo, mas o álcool deixou de fazer falta para que tivessemos que ceder à atracção que existia entre nós. E isso assustou-me.
Nunca fui uma mulher de grandes histórias de amor, não sonhava casar e ter filhos não fazia parte dos meus planos. Sempre rejeitei relações que exigissem muito de mim, nunca me senti preparada para o desgaste emocional que uma relação pode trazer a quem a vive. As minhas amigas tinham dificuldade em compreender alguém como eu, em perceber o porquê de venerar a solidão em que mergulhei, em querer viver um dia de cada vez, sem planos nem compromissos. Eu também não as compreendia, não percebia como eram capazes de entregar a sua vida a uma relação, de dar tanto de si a construir algo que um dia lhes podia falhar. Já ninguém me pedia conselhos, sabiam a minha resposta óbvia, directa e crua Não estás feliz deixa-o de uma vez! Já dizia a minha avó que por morrer uma andorinha não se acaba a Primavera! E elas olhavam para mim indignadas por eu ser incapaz de compreender que aquele era o homem das suas vidas. Por mais que eu tentasse, não conseguia ser como elas. Crescemos juntas, e eu via agora as minhas amigas a noivar, a casar, a pensar em ter filhos. Enquanto eu continuava a viver sozinha, a não criar laços nem raízes. Por isso, e porque contigo as coisas não seriam diferentes, decidi que naquela noite teria que encontrar uma forma de te explicar quem eu era, para que não criasses em ti a ilusão de uma L que na verdade nunca existirá.
-P?
-Diz-me L, não está bom o arroz?
-Não é isso, está tudo optimo! Só que tive uma ideia!
-Qual?
-Vamos jogar a um jogo, que achas?
-Acho uma óptima ideia, mas qual?
-O jogo é simples, só tem uma regra.
-Que regra?
-Quem se apaixonar perde.
-Como assim?
-Se algum de nós se apaixonar pelo outro perde o jogo. E quem perder afasta-se.
-Esse é um jogo muito fácil para ti L, és a mulher pedra, não tens sentimentos.
-P, sabes bem que somos iguais! Estamos em igualdade de circunstâncias, portanto ninguém está a ser favorecido!
P levantou-se da mesa, foi em direcção ao sofá e vestiu o casaco dirigindo-se à porta.
-Onde vais?
-Embora. Já perdi, e as regras eram claras, quem perder afasta-se. Não é verdade L?
-Quando saíres fecha a porta.
Nunca fui uma mulher de grandes histórias de amor, não sonhava casar e ter filhos não fazia parte dos meus planos. Sempre rejeitei relações que exigissem muito de mim, nunca me senti preparada para o desgaste emocional que uma relação pode trazer a quem a vive. As minhas amigas tinham dificuldade em compreender alguém como eu, em perceber o porquê de venerar a solidão em que mergulhei, em querer viver um dia de cada vez, sem planos nem compromissos. Eu também não as compreendia, não percebia como eram capazes de entregar a sua vida a uma relação, de dar tanto de si a construir algo que um dia lhes podia falhar. Já ninguém me pedia conselhos, sabiam a minha resposta óbvia, directa e crua Não estás feliz deixa-o de uma vez! Já dizia a minha avó que por morrer uma andorinha não se acaba a Primavera! E elas olhavam para mim indignadas por eu ser incapaz de compreender que aquele era o homem das suas vidas. Por mais que eu tentasse, não conseguia ser como elas. Crescemos juntas, e eu via agora as minhas amigas a noivar, a casar, a pensar em ter filhos. Enquanto eu continuava a viver sozinha, a não criar laços nem raízes. Por isso, e porque contigo as coisas não seriam diferentes, decidi que naquela noite teria que encontrar uma forma de te explicar quem eu era, para que não criasses em ti a ilusão de uma L que na verdade nunca existirá.
-P?
-Diz-me L, não está bom o arroz?
-Não é isso, está tudo optimo! Só que tive uma ideia!
-Qual?
-Vamos jogar a um jogo, que achas?
-Acho uma óptima ideia, mas qual?
-O jogo é simples, só tem uma regra.
-Que regra?
-Quem se apaixonar perde.
-Como assim?
-Se algum de nós se apaixonar pelo outro perde o jogo. E quem perder afasta-se.
-Esse é um jogo muito fácil para ti L, és a mulher pedra, não tens sentimentos.
-P, sabes bem que somos iguais! Estamos em igualdade de circunstâncias, portanto ninguém está a ser favorecido!
P levantou-se da mesa, foi em direcção ao sofá e vestiu o casaco dirigindo-se à porta.
-Onde vais?
-Embora. Já perdi, e as regras eram claras, quem perder afasta-se. Não é verdade L?
-Quando saíres fecha a porta.
quarta-feira, 12 de setembro de 2012
Cuida de mim.
Ali estava eu, de malas e bagagens no meio da rua. Chovia e eu precisava de um sítio onde me abrigar. Olhei para ti, na esperança de te ouvir dizer que voltasse rapidamente para o carro, mas arrancaste descontraidamente e vi-te ir embora. Corri rapidamente em direcção ao café mais próximo, mas as malas atrasavam-me os movimentos e o guarda-chuva ameaçava fugir, tentado pelo vento. Quando finalmente alcancei o café, olhei para o espelho de moldura dourada que embelezava a parede da entrada e vi uma mulher de cabelos molhados e escorridos, com a maquilhagem borratada, as roupas humidas coladas à pele. Vi-me a mim, tal como me havias deixado ficar. Eu e os meus vinte anos certamente haviamos de encontrar uma qualquer maneira de voltar para casa que não implicasse atrasar os teus planos. Sentei-me numa mesa logo à entrada, não fazia grande questão de passear naquele estado pelo café e as malas não me ajudavam. Um senhor de meia-idade veio perguntar se desejava alguma coisa e eu pedi um café curto enquanto tirava um cigarro do maço. Pus o açucar no café, mexi e acendi o cigarro enquanto pensava numa alternativa para voltar para casa, lembrei-me que me tinhas dito para ligar a um amigo para me vir buscar. Disseste-o com o propósito de te dar um ar preocupado, para que o amigo que ia contigo não achasse que eras um namorado demasiado desleixado, deixando-me ali sozinha sem saber como ir para casa porque tinhas planos. E os teus planos eram de extrema importância. Não podias chegar atrasado ao jantar, que falta de educação! Ah, espera, mas deixares-me no meio da cidade com o objectivo de me desenrrascar e ir para casa... será certamente de alguém com berço! Tinha que parar com os devaneios e arranjar uma solução, teria tempo para choradinhos e esperneadelas quando estivesse finalmente no aconchego de minha casa. Abri a minha mala e tirei o telemóvel. Olhei assustada para o visor que não dava sinais de vida por mais que eu tentasse ligar o telemóvel. Percebi que não tinha bateria e aí soube o que sente alguém quando não tem alternativas, quando se esgotam as soluções. Tirei outro cigarro, era o último. Ali estava eu, sem tabaco, nem dinheiro, nem qualquer solução. De repente senti uma mão no meu ombro, virei-me e vi o J. Ele olhou para mim e viu a lágrima que naquele momento me escorria pelo rosto. Limpou-me a lágrima com carinho, sentou-se em frente a mim e disse-me:
-Que se passa? Porque estás aqui a chorar e nesse estado?
-Dá-me um cigarro.
-Tu sem tabaco? Agora é que não estou mesmo a perceber nada!
-Não tenho tabaco, não tenho dinheiro, nem como ir para casa! Estou encharcada e tenho fome e agora que já ouviste o discurso de coitadinha da tua ex-namorada dá-me um cigarro por favor!
Ele deu-me o cigarro e nenhum de nós disse nada. Ali estava ele, o meu ex-namorado. Quantas dores de cabeça me havia dado e o quanto eu gostei dele! Foram tantas as noites sem dormir, enquanto ele andava de bar em bar com uns e com outras. Quantas vezes eu soube das suas traições, das noitadas, das mentiras descaradas. Mas eu gostava dele e sabia que ele gostava de mim. Eu sabia que era verdade quando ele dizia que o maior sonho da sua vida era casar comigo. Mas também soube que não podia continuar com ele, precisava de paz e o J nunca teria tal coisa para me oferecer.
Subitamente ele quebra o silêncio e os meus pensamentos e diz-me:
-O teu namorado L? Onde está ele?
-Teve uns compromissos e deixou-me aqui. Preciso de ir para casa, levas-me a casa?
-Levo sim. Mas primeiro vai lavar a cara e tira esses restos de maquilhagem. Não precisas dessas coisas para nada! Quantas vezes terei que te dizer? És linda. E agora vai lá enquanto eu te peço uma tosta!
-Eu não tenho dinhei...
-Shiu! Eu estou aqui L, já não precisas de ter medo. Cheguei para cuidar de ti.
Comi a tosta, enquanto conversava com o J e me ria das suas piadas descabidas e pensava na sorte que tinha por ele estar ali. No fim levou-me a casa e eu dei-lhe um abraço, quando o soltei ele disse-me:
-Um dia vais perceber que há uma linha que separa o imbecil que eu fui contigo do imbecil que é o teu namorado. Porque eu estou aqui.
-Então fica.
-Fico?
-Fica comigo.
-Hoje? Estas com medo?
-Sempre. Eu preciso que cuidem de mim.
-Eu cuido L, eu cuido...
-Jura!
-Juro, pelos filhos que um dia vamos ter, que cuidarei sempre da mãe deles.
E uma lágrima escorreu pela minha face, desta vez não por me sentir perdida, mas por me sentir segura nos seus braços, e não nos teus, porque mesmo que um dia ele andasse por aí de bar em bar, se eu precisasse, eu sei que ele viria.
Ironias do destino? Talvez.
-Que se passa? Porque estás aqui a chorar e nesse estado?
-Dá-me um cigarro.
-Tu sem tabaco? Agora é que não estou mesmo a perceber nada!
-Não tenho tabaco, não tenho dinheiro, nem como ir para casa! Estou encharcada e tenho fome e agora que já ouviste o discurso de coitadinha da tua ex-namorada dá-me um cigarro por favor!
Ele deu-me o cigarro e nenhum de nós disse nada. Ali estava ele, o meu ex-namorado. Quantas dores de cabeça me havia dado e o quanto eu gostei dele! Foram tantas as noites sem dormir, enquanto ele andava de bar em bar com uns e com outras. Quantas vezes eu soube das suas traições, das noitadas, das mentiras descaradas. Mas eu gostava dele e sabia que ele gostava de mim. Eu sabia que era verdade quando ele dizia que o maior sonho da sua vida era casar comigo. Mas também soube que não podia continuar com ele, precisava de paz e o J nunca teria tal coisa para me oferecer.
Subitamente ele quebra o silêncio e os meus pensamentos e diz-me:
-O teu namorado L? Onde está ele?
-Teve uns compromissos e deixou-me aqui. Preciso de ir para casa, levas-me a casa?
-Levo sim. Mas primeiro vai lavar a cara e tira esses restos de maquilhagem. Não precisas dessas coisas para nada! Quantas vezes terei que te dizer? És linda. E agora vai lá enquanto eu te peço uma tosta!
-Eu não tenho dinhei...
-Shiu! Eu estou aqui L, já não precisas de ter medo. Cheguei para cuidar de ti.
Comi a tosta, enquanto conversava com o J e me ria das suas piadas descabidas e pensava na sorte que tinha por ele estar ali. No fim levou-me a casa e eu dei-lhe um abraço, quando o soltei ele disse-me:
-Um dia vais perceber que há uma linha que separa o imbecil que eu fui contigo do imbecil que é o teu namorado. Porque eu estou aqui.
-Então fica.
-Fico?
-Fica comigo.
-Hoje? Estas com medo?
-Sempre. Eu preciso que cuidem de mim.
-Eu cuido L, eu cuido...
-Jura!
-Juro, pelos filhos que um dia vamos ter, que cuidarei sempre da mãe deles.
E uma lágrima escorreu pela minha face, desta vez não por me sentir perdida, mas por me sentir segura nos seus braços, e não nos teus, porque mesmo que um dia ele andasse por aí de bar em bar, se eu precisasse, eu sei que ele viria.
Ironias do destino? Talvez.
domingo, 26 de agosto de 2012
Quem espera, desespera.
Combinamos tomar um café naquela tarde ensolarada de Domingo. O meu relógio ainda não marcava as 15h e eu já tinha chegado à esplanada onde algo dentro de mim me fazia acreditar que tudo iria mudar e desta vez para melhor. Sabia que ia ter que esperar um pouco, acendi o meu cigarro e pedi um café curto. Sorri à empregada de mesa quando me trouxe o café, era um grande dia e queria partilhar a minha felicidade. Tu estavas de volta, de volta na minha vida. Tinha agora a oportunidade de fazer tudo dar certo, de remendar o passado, de dar uma nova oportunidade não só a nós, mas a mim mesma. Trazia um vestido branco que realçava o meu bronze e me dava um ar descontraído, queria disfarçar o nervosismo de te ter por perto. O tempo passava devagar e eu aguardava a tua chegada, aguardava o momento em que te pudesse dizer a falta que me fazias e contar como a minha vida tinha mudado. Dizer-te que aprendi a ser a minha própria companhia, que eu e a cozinha fizemos as pazes, que aprendi a contar comigo e só comigo e que me tenho desiludido menos desde esse dia. Contar-te que penso em ti de cada vez que faço a mala e vou por aí, como se não tivesse casa, ou família, ou amigos, tirando fotos a cada pormenor que seria descabido para muitos, mas que faria todo o sentido aos nossos olhos. Essas ideias invadiram a minha cabeça por longos momentos. Instintivamente olhei para o relógio e já eram quase 16h. Fiquei petrificada a olhar para o relógio de prata que me iluminava o pulso e em seguida, numa tentativa de que os meus olhos te encontrassem, olhei em volta. Nenhum sinal da tua presença. Tentei convencer-me a mim mesma que uma hora de atraso poderia ser normal, percebi que não, pensei então que devia ter acontecido alguma coisa grave, não poderia haver outra justificação para me teres deixado ali à tua espera. Decidi ligar-te para saber o que tinha acontecido mas tu não me atendeste. Foi então que caí na realidade, se não estavas ali naquele momento era porque não querias, sempre soubeste o trabalho que dava manter alguém como eu a teu lado. Seria mais fácil não me teres por perto e logo tu que sempre preferiste comodidades. Não sei explicar o que me passou pelo coração naquele momento, a dor foi dilacerante. Peguei no telemóvel e enviei-te uma mensagem: Peço desculpa por só avisar agora, tentei ligar, mas não atendeste, não dá para irmos tomar café surgiram imprevistos. Beijo.
Se sabias tão bem o quanto custa manter alguém como eu a teu lado, também deverias saber que fracos somos todos, mas nem todos o admitem.
Chamei a empregada de mesa e pedi outro café, desta vez não sorri, não tinha mais felicidade para partilhar, ela olhou para mim com simpatia, como se estivesse a perceber o que se estava a passar e disse-me:
- Às vezes os cafés ajudam-nos a acordar, quando os olhos vêem mas o coração não quer acreditar.
Se sabias tão bem o quanto custa manter alguém como eu a teu lado, também deverias saber que fracos somos todos, mas nem todos o admitem.
Chamei a empregada de mesa e pedi outro café, desta vez não sorri, não tinha mais felicidade para partilhar, ela olhou para mim com simpatia, como se estivesse a perceber o que se estava a passar e disse-me:
- Às vezes os cafés ajudam-nos a acordar, quando os olhos vêem mas o coração não quer acreditar.
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
Não tens frigorífico em casa?!
Bati com a porta do teu carro, a força que utilizei foi exagerada e desproporcionada. Ouvi-te gritar: Não tens frigorífico em casa?! Respondi-te, com um desdém estampado no rosto: Tenho. Mas se eu partir a porta do meu frigorífico não deixo de comer iogurtes, não tenho culpa que não tenhas outro carro para conduzir no dia em que o teu velho Ford te falhar, mas começa a pensar em planos B. Porque no dia em que eu te deixar, também terás que encontrar um outro alguém para amar. E por falar nisso, vou comprar outro frigorífico, não vá eu um dia destes partir a porta, logo eu que gosto tanto de iogurtes. Logo eu que tenho sempre um plano B.
sexta-feira, 27 de julho de 2012
Felicidades aos noivos!
Ouvi dizer que casaste. Aqui onde eu estou, a mais de sete mil kilómetros de distância, as novidades chegam devagar e descompassadamente. Não estranhei portanto, quando em conversa ao telemóvel com a C, esta interrompeu bruscamente os detalhes da sua gravidez e gritou, com a sua voz estridente dos nossos tempos de 16 anos: Eu já te disse quem casou? Meu Deus, não acredito que só me lembrei disto agora! O J casou, deve estar a fazer mais ou menos um mês por estes dias!
Lembro-me de ter engolido em seco, não pelo impacto negativo da noticia, mas sim pela surpresa inesperada. Tu casaste. Os seis anos que nos separam fizeram-te avançar no tempo (na verdade, acho que fui eu quem estagnou mas se recusa a admitir). Uma sensação estranha tomou conta de mim, fui invadida por flashes de memórias, memórias do tempo em que dávamos as mãos e planeávamos cada detalhe do nosso casamento, rindo e imaginando quem ainda estaria junto nessa altura e quem se reencontraria inesperadamente à entrada da igreja ou mesmo a meio do copo d'àgua. Nessa altura não imaginavam as nossas cabeças, muito menos os nossos corações, que quem já não estaria junto pela altura do teu casamento seríamos nós.
De qualquer forma, felicidades aos noivos.
Lembro-me de ter engolido em seco, não pelo impacto negativo da noticia, mas sim pela surpresa inesperada. Tu casaste. Os seis anos que nos separam fizeram-te avançar no tempo (na verdade, acho que fui eu quem estagnou mas se recusa a admitir). Uma sensação estranha tomou conta de mim, fui invadida por flashes de memórias, memórias do tempo em que dávamos as mãos e planeávamos cada detalhe do nosso casamento, rindo e imaginando quem ainda estaria junto nessa altura e quem se reencontraria inesperadamente à entrada da igreja ou mesmo a meio do copo d'àgua. Nessa altura não imaginavam as nossas cabeças, muito menos os nossos corações, que quem já não estaria junto pela altura do teu casamento seríamos nós.
De qualquer forma, felicidades aos noivos.
domingo, 10 de junho de 2012
Vou-te contar um segredo
Vou-te contar um segredo. Esse papel que tão ridiculamente protagonizas um dia já me pertenceu. Por isso e por mais ainda, sei bem o que sentes. E o que te leva a tornareste assim, tão ridículo. Não me aboreces, nem tão pouco me enlouqueces com os teus jogos psicológicos que nem tu compreendes. Sei bem o que é não querer admitir a dor de ter sido deixado, como se de um cachorrinho se tratasse, abandonado pela altura das férias de Verão porque os donos querem ir de férias e ele vai-se tornar um 'empata festas'. Sei bem o que é a sede de vingança que toma conta de ti, também eu já me senti assim. Mas meu querido, estás a ir pelo caminho errado. E ninguém melhor do que eu para te dizer, porque eu já tropecei em todas as pedras do caminho que tu escolheste. Esses opostos que te dominam, o querer parecer bem e tratar-me bem, e o querer parecer ainda melhor e tentar fazer com que eu me sinta mal comigo mesma... Bem, nunca me afetarão. E tu tens que perceber isso, antes que te deixes consumir por dentro. Estás a deixar-te levar pelo sentimento de amor-ódio que te move contra e a meu favor. Não queiras isso para ti, porque por mais que tentes negar, não há um dia em que não sintas a minha falta, em que não desejes, do fundo do coração, ter-me de volta. Mas negas, e negas e negas. E continuarás sempre a negar. Porque dói aceitar, e tu hás-de sempre evitar essa dor. Nunca te olharás no espelho e terás coragem de dizer: Ela deixou-me, ela não gosta de mim e eu continuo ridiculamente apaixonado por ela. Por isso mesmo, e porque esse dia não chega, continuarás a ser o mesmo cachorrinho abandonado, na esperança que os donos se lembrem do beco onde te deixaram esquecido numa rua perdida da cidade e te queiram de volta. Porque afinal, não passavas de um cachorrinho mas sempre servias para afugentar os pássaros.
quarta-feira, 6 de junho de 2012
Escolhas
Não te metas com um mecânico, têm fama de bajular tudo o que é mulher que use mini-saia. Não queiras um médico, usarão sempre os turnos como desculpa para não ir passear contigo ao Domingo à tarde. Não prefiras um advogado, com o tempo ganhará mais habilidade para encontrar argumentos que justifiquem as mensagens de número desconhecido no seu telemóvel do que para te dizer a verdade de todos os factos. Não queiras um jogador de futebol, uma mulher elegante não aceita ser conversa de balneário depois do treino. Não queiras um engenheiro, és uma mulher com sentimentos e não estarás preparada para que ele trasnforme a tua vida num cálculo de probabilidades. Não optes por um arquitecto, não nasceste para ser mais um projecto que não passará de uma maquete. Não te rendas a um jornalista, mostrar-se-ão mais dispostos a comentar as tuas atitudes do que a mudar a deles. Não te deixes levar por um professor, nenhum homem tem mais a ensinar do que a aprender. Não te metas com um barman, homem da noite vai-te falhar durante o dia. Não te prendas a um caixa de supermercado, tudo o que te der terá um preço. Não queiras um soldado, na primeira oportunidade ele põe-te a marchar da vida dele.
Opta por um bêbedo, nunca ninguém conheceu um homem que dissesse tantas verdades.
Opta por um bêbedo, nunca ninguém conheceu um homem que dissesse tantas verdades.
segunda-feira, 4 de junho de 2012
A fotografia
Ouvi dizer que ainda guardas a minha fotografia na tua carteira. Não gosto muito dela, mas no dia em que me mostraste onde a tinhas guardado para que eu estivesse sempre contigo, eu lembro-me de ter sorrido.
No outro dia, quando numa conversa de café o teu amigo P me disse que ainda a trazias contigo, respondi-lhe após uns demorados segundos a pensar: Faz-me um favor, pede-lha de volta. Essas fotografias dão sempre jeito para os documentos pessoais! E sorri. A R, sentada junto a mim sussurrou-me ao ouvido: Tu também ainda guardas a fotografia dele, vê lá, também lhe pode dar jeito para os documentos pessoais...
Não respondi e desejei do fundo do coração que a continuasses a guardar na carteira e que não precisasses de a abrir para te lembrares de mim.
No outro dia, quando numa conversa de café o teu amigo P me disse que ainda a trazias contigo, respondi-lhe após uns demorados segundos a pensar: Faz-me um favor, pede-lha de volta. Essas fotografias dão sempre jeito para os documentos pessoais! E sorri. A R, sentada junto a mim sussurrou-me ao ouvido: Tu também ainda guardas a fotografia dele, vê lá, também lhe pode dar jeito para os documentos pessoais...
Não respondi e desejei do fundo do coração que a continuasses a guardar na carteira e que não precisasses de a abrir para te lembrares de mim.
quinta-feira, 31 de maio de 2012
The bitch is back!
Vou voltar, de malas e bagagens. Não te preocupes, não tenho intenções de cruzar o teu caminho, conheço todas as ruas dessa cidade. Porque bem antes de tu chegares, já todas essas ruas me conheciam os passos. Não acredites se te disserem que voltei para recuperar o que perdi. Já nada do que aí deixei me pertence, nem a mesa do café, nem a revista que me guardava o João do quiosque, nem o último pastel de carne do bar, muito menos o namorado que hoje é teu. E quando te tentarem convencer de que eu exigirei o meu lugar de volta, acredita no que te digo, esse lugar já à muito que não me pertence. Hoje é teu. As ruas dessa cidade são tuas, por melhor que eu as conheça. A mesa do café já não espera por mim, o João do quiosque já não me guarda a última revista com a certeza de que eu não passarei lá ao fim do dia e no bar já ninguém espera que eu chegue a tempo do último pastel de carne. O namorado que um dia foi meu já apagou o meu número da lista telefónica e já ocupou no seu coração o lugar que um dia me pertenceu. E antes de gritarem the bitch is back! num uníssono que eu adivinho audível por toda a cidade, podem ter a certeza de que não terão de volta a mesma L que um dia viram partir. Porque se assim fosse, tu sabes que eu não ia pedir de volta o que me pertenceu um dia, eu ia ter de volta. Mas eu não estou preocupada com aquilo que perdi, porque eu não precisso de nada disso. Oh minha querida, também tu quando saíres daí vais perceber o quanto essa cidade nos mata, nos limita, nos abafa. E por mais que pareça impossível aos teus olhos, a L que tu conheceste não vive mais do que aí construiu, caso assim fosse não teria deixado tudo ruir. Um dia também tu perceberás que a vida lá fora é muito mais do que a vida de princesas que construímos nessa cidade, mas para isso terás primeiro que cair do trono e deixar o teu reino ruir. E por mais impossível que pareça aos olhos de uma pessoa como tu, só assim crescerás o suficiente para deixar de ser menina e te tornares uma mulher. Acredita no que te digo, porque tudo o que tens hoje, um dia já foi meu. E ainda bem que o meu reinado caiu, porque a verdadeira felicidade sempre esteve no meio do povo, onde as gentes são tão mais simples e não existem príncipes desencantados.
LL
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Vingança
As pessoas que hoje me conhecem não acreditam que eu já tive sentimentos, não acreditam que dentro de mim já houve mais do que este cubo de gelo, não acreditam porque não te conhecem. Se elas soubessem o quanto te amei, entenderiam o porquê de eu hoje rejeitar essa magia a que muitos chamam amor e eu chamo passado. Dei tanto de mim que parte de mim ficou em ti, naquilo que construimos juntos, do qual restam apenas fotografias, presentes esquecidos no fundo de uma gaveta, lembranças de palavras apaixonadas. Fiquei sem força, sem coragem, sem vontade de voltar a construir pontes, deixando os muros que me envolvem crescer de tal maneira que hoje, hoje ninguém chega até mim. As mesmas pessoas das quais ja te falei, as que hoje me conhecem, não acreditariam se lhes dissesses que eu já tive mais do que fugazes casos de uma noite de copos, que eu já fui mulher de um só homem, bem antes de ser uma mulher de homens. A certeza de que aquela mulher que conheceste jamais voltará é enorme. Foi substituida pelo que hoje sou. E o que sou eu hoje? Uma mulher livre. Livre de ódios e amores, livre de culpas, livre de interesses, porque nada em mim me faz pensar nas consequências, nada em mim me leva a repensar uma atitude. Eu faço porque sim, porque me apetece e porque no dia a seguir restará talvez uma ressaca ou quanto muito mensagens no telemóvel às quais certamente não responderei. Porque nada na minha vida dura mais do que uma noite. Não preciso de histórias de uma vida, não quero histórias de uma vida, pedaços de histórias inacabadas de noites alheias são suficientes para mim. Não para me fazerem feliz, mas para me fazerem esquecer o vazio que em mim deixaste. Fiquei assim, uma mulher de maus hábitos, uma mulher sem amor para dar nem tão pouco com vontade de o receber. Quem sou hoje? Uma mulher que se deixa acabar em vícios, que troca beijos desapaixonados em noites rapidamente esquecidas, uma mulher que decidiu ser ela a partir corações antes de deixar alguém sequer pensar em partir o seu. Esta sou eu. Esta é a mulher que tu hoje dirias que não conheces, esta é a mulher que tu transformaste em máquina, a mulher que reuniu nela tudo o que tu mais desprezas numa mulher. Porque a deixaste e ela foi tonta o suficiente para pensar que essa seria a melhor vingança, não percebendo que se estava a vingar era dela mesma. Por um dia te ter amado.
E já lá vai um ano*
E já lá vai um ano*
segunda-feira, 26 de março de 2012
Um mundo só já não chega, dá-me um espaço!
Vou-te oferecer uma viagem. Não estranhes, e não, não fiquei um amor e muito menos endinheirada. É uma viagem sem custos para nenhum de nós, mais do que isso, uma viagem vantajosa para ambos. Por mim, e se a minha mesada o permitisse, o destino era a lua. Pelo menos lá teria a garantia que estavas bem longe, mais até, que mesmo que quisesses não poderias adiantar o teu regresso apanhando um comboio ou um avião qualquer. Eu conheço-te (e o tanto que isso me aborrece!) e sei bem que gostas de me provar que não sou eu quem controla a tua vida e que as coisas funcionam ao contrário. Portanto, só enviando-te num qualquer foguetão até à lua poderia estar descansada. Estou cansada de ti percebes? Já não há nada que me faça querer ficar onde sei que te vou encontrar, já não há nada que me faça atender o telemóvel quando o teu nome aparece no visor, já não há nada que me prenda a ti. Se eu percebo isso como é que não és capaz de perceber? Ou melhor, porque é que és o único a não querer perceber? Podia-te pedir um tempo de paz, mas tempo é o que mais há entre nós, esta história está velha, gasta, acabada. Eu não quero um tempo, quero um espaço, porque um mundo só já não chega. Quero que entendas de uma vez por todas a dimensão da necessidade de te afastar que há dentro de mim. Já nada do que possas fazer ou dizer me fará olhar-te de forma diferente. Vou-te explicar, da forma mais arrogante mas mais sincera que encontro, para que percebas de uma vez por todas: as pessoas desinteressam-me, o meu interesse nelas tem um prazo de validade muito curto. Algo como conhecer alguém, achá-lo interessante, conhecê-lo melhor e perder o interesse. Tu gostas de mim, tens lá culpa, eu não consigo gostar de ninguém, tenho lá culpa. Agora, (e de uma vez por todas!) pega naquilo que resta do teu orgulho, na mala cheia de boa sorte que preparei para ti e vai! A tua felicidade está algures por aí e mesmo não sabendo nada de nada, sei que jamais estará numa rapariga como eu. Porque eu não nasci para encontrar alguém e fazê-lo feliz, eu nasci para que me deixem ser feliz!
Boa viagem, LL.
Boa viagem, LL.
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
A tua ex-namorada
Sabes quem vi hoje? A tua ex-namorada. Encontrei-a na pastelaria onde costumavas levá-la. Tinha um ar cansado, cansado da vida se é que percebes o que te quero dizer... Estava sozinha, perdida em pensamentos enquanto saboreava um chocolate quente, como costumavam tomar quando iam lá os dois. E sem se aperceber tinha os olhares masculinos todos centrados nela. É linda, é realmente muito bonita. Bem mais bonita do que parecia nas fotos que encontrei na última gaveta da tua secretária. Já te tinha falado nisso? Não, claro que não. Não tive coragem de te perguntar porque é que aquilo ainda estava ali. Optei pela estratégia que adopto quando percebo que algo está errado, fingir que não se passa nada. Pode ser fraco da minha parte, mas é tão mais fácil! Como te estava a contar, reparei também que trazia a camisola azul que lhe deste quando fizeram um ano de namoro. Lembraste? Parecida à que me ofereceste no meu aniversário. Mas ficava bem melhor nela. Estava com o J, ele também reparou nela e no seu olhar triste. Deves ter magoado muito aquele coração. Nunca percebi muito bem o que vos aconteceu. Sabes, eu não sou ela, por mais que tente. Não sou tão bonita e nem sequer gosto de azul. A minha mãe nunca te fará um bolo no teu aniversário e também nunca ficará feliz por te ver lá em casa. Não, pelo menos não como a dela ficava. O meu pai nunca irá ver os jogos de futebol da Selecção contigo, porque ele nem sequer gosta de futebol. Eu não te posso dar tudo o que ela te deu, não posso fazer por ti o que ela fez, viver contigo o que ela viveu, porque eu não sou ela e nunca serei. Eu nunca te entregarei a minha vida como ela te entregou, porque eu não quero acabar como ela. Agarrada às memórias de um passado que já nem lhe pertence. Ela nem olhou à sua volta, nem se apercebeu que na cabeça da maior parte dos homens que ali estavam, estava o pensamento de um dia vir a ter uma mulher como ela. Sabes porquê? Claro que sabes. Porque o seu coração te pertence. Senti as minhas mãos a gelarem. Tive medo, muito medo. Medo de um dia ser eu a sentar-me naquela cadeira. Não me leves nunca ali, não me peças para beber chocolate quente contigo e mais do que isso, não me peças para ser ela. Ela é bem mais bonita e eu nem sequer gosto de azul.
terça-feira, 3 de janeiro de 2012
Bem vinda ao mundo encantado das mentiras.
03:00h
-L, estás bem?
-Foi tudo um sonho? Diz-me que sim M!
-Oh L, já te pedi tanto para parares de pensar nisso, já passou. Acabou. Está tudo bem.
(...)
-Diz-me, mesmo depois de tudo, não merecia pois não?
-Não L, não merecias. Aliás, tu merecias era mais, bem mais respeito da parte dele.
L levantou-se, a custo, com olhar cansado, rosto apagado e um olhar demasiado brilhante. Acabada de cair na realidade, de perceber que não seria sempre ela quem faria sofrer, um dia a dor também lhe iria bater à porta, esse dia só não precisava de ser hoje. Mas foi. Bem-vinda L, ao mundo encantado das mentiras.
-Vou escrever-lhe M.
-Não faças isso, não merece nem uma palavra tua! Dorme, descansa.
-Eu sei, vou escrever-lhe sem que ele algum dia chegue a ler o que tanto lhe quis dizer.
"Não te pergunto como tens passado, não me interessa. Não espero que estejas mal, apenas não me interessa. Já senti raiva de ti, já senti mágoa, agora não sinto nada. Anestesiei-me com a certeza de que não merecia que me tivesses enganado desta forma. Não merecia que me tivesses feito acreditar num mundo que na verdade só existia na minha cabeça. De todas as mentiras ditas por ti, "eu amo-te" foi a minha preferida, sabes? Foi aquela que mesmo sendo enganadora me fez sentir a mulher mais sortuda deste mundo. Porque te tinha comigo. Mas a tua máscara caiu e eu ganhei consciência da realidade. Percebi que tudo aquilo que um dia eu julgava ter construido contigo só existia na minha cabeça, no mundinho cor-de-rosa que eu insistia em pintar para viver. Espero que entendas como foste cruel, mais do que isso, cobarde. Nunca entendi o nosso fim, mas também nunca te pedi explicações. Para mim um fim não tinha explicação. Acabou. Não há nada a acrescentar. Mas mesmo assim, teria sido tão mais fácil teres-me dito a verdade. Teres-me dito que à muito tempo que eu deixara de ser a tua menina e que tinhas construido um outro mundo do qual eu não fazia parte. Não precisavas de me ter mentido, de me ter enganado, qualquer coisa teria sido melhor. Hoje se é estranho para mim entender que não és mais do que um desconhecido, não é por amor, é porque o sentimento de mágoa acha que a vingança mais fácil chegará no dia em que perceberes que eu fui tanto e me perdeste por tão pouco. Quando soube, julguei que iria perder o equilibrio, mas não, quase perdi a pulsação. Podia dar mil e um motivos para te ter escrito esta carta, mas não há tantos, apenas um. Escrevi-te para que percebas que não és nada. E pior do que sentir raiva de ti, é sentir rigorosamente nada,
LL"
-L, estás bem?
-Foi tudo um sonho? Diz-me que sim M!
-Oh L, já te pedi tanto para parares de pensar nisso, já passou. Acabou. Está tudo bem.
(...)
-Diz-me, mesmo depois de tudo, não merecia pois não?
-Não L, não merecias. Aliás, tu merecias era mais, bem mais respeito da parte dele.
L levantou-se, a custo, com olhar cansado, rosto apagado e um olhar demasiado brilhante. Acabada de cair na realidade, de perceber que não seria sempre ela quem faria sofrer, um dia a dor também lhe iria bater à porta, esse dia só não precisava de ser hoje. Mas foi. Bem-vinda L, ao mundo encantado das mentiras.
-Vou escrever-lhe M.
-Não faças isso, não merece nem uma palavra tua! Dorme, descansa.
-Eu sei, vou escrever-lhe sem que ele algum dia chegue a ler o que tanto lhe quis dizer.
"Não te pergunto como tens passado, não me interessa. Não espero que estejas mal, apenas não me interessa. Já senti raiva de ti, já senti mágoa, agora não sinto nada. Anestesiei-me com a certeza de que não merecia que me tivesses enganado desta forma. Não merecia que me tivesses feito acreditar num mundo que na verdade só existia na minha cabeça. De todas as mentiras ditas por ti, "eu amo-te" foi a minha preferida, sabes? Foi aquela que mesmo sendo enganadora me fez sentir a mulher mais sortuda deste mundo. Porque te tinha comigo. Mas a tua máscara caiu e eu ganhei consciência da realidade. Percebi que tudo aquilo que um dia eu julgava ter construido contigo só existia na minha cabeça, no mundinho cor-de-rosa que eu insistia em pintar para viver. Espero que entendas como foste cruel, mais do que isso, cobarde. Nunca entendi o nosso fim, mas também nunca te pedi explicações. Para mim um fim não tinha explicação. Acabou. Não há nada a acrescentar. Mas mesmo assim, teria sido tão mais fácil teres-me dito a verdade. Teres-me dito que à muito tempo que eu deixara de ser a tua menina e que tinhas construido um outro mundo do qual eu não fazia parte. Não precisavas de me ter mentido, de me ter enganado, qualquer coisa teria sido melhor. Hoje se é estranho para mim entender que não és mais do que um desconhecido, não é por amor, é porque o sentimento de mágoa acha que a vingança mais fácil chegará no dia em que perceberes que eu fui tanto e me perdeste por tão pouco. Quando soube, julguei que iria perder o equilibrio, mas não, quase perdi a pulsação. Podia dar mil e um motivos para te ter escrito esta carta, mas não há tantos, apenas um. Escrevi-te para que percebas que não és nada. E pior do que sentir raiva de ti, é sentir rigorosamente nada,
LL"
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